quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Um anjo de demônio



Hoje acredito no bem no mal que habita em cada um de nos, através de Maria um anjo que me mostrou a sua outra face.
Quando ela estava com a idade de doze anos a mãe morreu de infarto, e o pai achou que não tinha condições de criá-la . Fiquei com pena da menina e me ofereci para ficar com ela. Logo depois disso o pai foi embora para a Bahia, e vez ou outra tínhamos notícias dele.
Maria era um anjo. Uma criança extremamente doce que sempre se lembrava da sua família com alegria, mas dizia sentir mais a falta do pai do que da mãe. Um dia à perguntei porquê; é ela com a sua voz meiga me respondeu, que diferente da mãe, ele nunca teve medo de ser o que era e de dizer o que pensava. Que ele foi capaz de deixá-la sem remorsos e sem dores porque isso era o mais certo para ele. Ela crescia numa família feliz e estruturada, rodeada de chamegos do meu marido Armando e dos meus dois filhos gêmeos Pedro e Matheus dois anos mais velho que ela, que sempre quiseram uma irmã.
Maria se tornou uma jovem linda e meiga, começou a trabalhar e todo o mês mandava para o pai mais da metade do que ganhava. Quando completou dezoito anos fizemos uma festa, e foi nesse dia que o que vi acontecer não quiseram acreditar os meus olhos. A casa estava cheia de amigos e parentes que adoravam aquela doce criatura, quando na frente de todos ela ergueu uma taça de champanhe e fez a seguinte declaração. “A partir de hoje eu sou livre! Livre do desprezo de todos vocês, livre do enfado dessa família, livre para odiar o meu pai por ter me abandonado!” A cada frase que dizia rodopiava pela sala entre os presentes, e naquele momento não foi doçura que vi em seus olhos, mas a face do demônio. Ela falou barbaridades que deixaram a todos em estado de choque.
Logo depois ela fez as malas e saiu de casa. Meu marido chorou por três dias seguidos, meus filhos não conseguiam se concentrar em coisa alguma, e eu sentia dentro de mim uma mistura de sentimentos que variava da dor ao ódio de ver todos a minha volta sofrendo tanto.
Por não agüentar mais tudo aquilo resolvi procurá-la. Consegui descobrir que ela estava morando num cortiço do outro lado da cidade. Quando cheguei no local fiquei enojada com tanta sujeira, o local era um prostíbulo onde viviam vagabundos e prostitutas. Quando entrei no quarto, ví num canto sombrio uma mulher de maquiagem borrada e roupas rasgadas me olhar com desprezo. Naquele momento o ar era fedido e parecia que eu tinha descido ao inferno. Não consegui encontrar naquela mulher nem um traço da menina doce que sempre foi. “O que quer aqui ?” Perguntou ela. _ Eu quero poder ajudá-la. Respondi. “Mentira você quer ajudar a si mesma. Eu não preciso de ajuda, não quero mais a sua pena, eu apenas resolvi viver o meu outro lado”. _ De que lado você está falando? “De um outro lado que existe em cada um de nós, e que ocultamos, um lado que nos permite ser e fazer o que o lado bom não permite.” _É porquê você quer isso ? “Para desprezar você que só me quis por pena.”_ Mas eu sempre amei você. “O que é que você chama de amor? Durante todos esses anos eu fui sempre o que você quis que eu fosse, até começar o ciúme a inveja. Ou você acha que eu não percebia o que o seu outro lado falava quando o seu marido me colocava no colo e me dava carinho como daria a filha que não teve. Você pensava, preciso tomar cuidado, ela já é uma mulher, tão linda e tão meiga que pode envolvê-lo. Ou então preciso afastá-la daqui, os meninos ouvem mais à ela do que a mim. Diz que o que estou falando é mentira. Gritou ela aos prantos”. Nesse momento dentro de mim as lembranças se afloraram e o meu lado bom permitiu que eu enxergasse o mal. As cenas foram passando como se fosse um filme. Sim eu a queria longe de casa, ela era uma ameaça ao meu casamento, ela era doce demais, meiga demais, a ponto de me irritar. Os meus filhos não me abraçavam mais, todos os carinhos e atenções da casa eram para ela, meu Deus como pude ser tudo isso. O mal tomou conta de mim comecei a gritar para ela parasse de falar, mas não era ela quem falava, era a minha própria voz me acusando que eu ouvia.
De repente eu comecei a dizer coisas horríveis. _ É verdade, eu odeio o seu rosto lindo, a sua juventude. Há muito tempo eu vinha pensando numa forma de afastá-la da minha casa, da minha família, é incrível como você facilitou as coisas.
“Não!”. Gritou ela. “Não eu não facilitei, porquê se não você não estaria aqui, você está lutando consigo mesma, e o seu lado mal está vencendo o seu lado bom. Porquê você acha que fiz tudo o que fiz ? Para fazer você ver em si mesma o seu lado ruim, que estava sempre lutando contra mim, e que eu não conseguia ser forte o bastante para vencer... Eu amo você, por isso não consegui mais continuar lá”.
Quando ela chorando me disse essas palavras me vi diante de um espelho que se quebrava diante de mim. Em um dos lados do espelho eu vi a minha face contorcida e deformada e no outro uma face diante de uma luz que se apagava. Ví alí o anjo e o demônio que sempre existiram dentro de mim.
Eu sempre amei e odiei aquela menina com a mesma intensidade. Enquanto um outro demônio, o que vivia nela precisou tomar forma para que eu visse o meu próprio demônio. Neste momento me joguei no chão de joelhos e pedia a perdão a Deus e a ela. O anjo me abraçou e choramos duas horas seguidas incontrolavelmente. Depois daquele dia nunca mais fui a mesma, hoje tenho plena consciência que em cada um de nós habita um demônio pronto a tomar forma a cada momento de fraqueza, quanto à ela, voltou a ser, o anjo que sempre foi.

Fonte da imagem: http://que-bonito-e.blogspot.com/

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